[Ubuntu-BR] Flame War proposital, leia se quiser (ERA: Foco no Nautilus quando em quickstart do openoffice)
Paulino Michelazzo
listas em michelazzo.com.br
Sábado Setembro 23 14:23:12 UTC 2006
>
> Já fui mutas vezes enxovalhado em listas, não tive minhas perguntas
> respondidas, etc. Mas uma coisa importante que vocês tocaram no
> assunto é: o usuário que está saindo do windows e vindo para o Linux.
> Este usuário não gosta de ler manuais, tutoriais, etc. Ele quer a
> resposta pronta. E aí é que está o problema todo: quem aprendeu lendo,
> mexendo, quer que o inicinate faça o mesmo! Pode ir tirando o cavalo
> da chuva. Tenho experiência de amigos, aos quais apresentei o Linux, e
> que não foram para frente por este motivo: eles não gostam de
> aprender. Querem apenas usar.
Renato,
Tenho que discordar de você devido aos meus pelo menos 10 anos trabalhando
com treinamento de usuários de todas as plataformas.
Na verdade padecemos por dois problemas crônicos onde um se reflete no outro
de uma forma muito intensa. A comunidade Linux, com raras excessões, é ruim
demais para fazer um how-to, um tutorial ou até mesmo para escrever um
e-mail, sendo muitas vezes vergonhoso as "pérolas" que escrevem. Isso
acontece em nosso país por um motivo histórico. Carregamos conosco uma
herança maldita desde nossos colonizadores no tocante a educação e mesmo com
o teatro da abolição da escravatura, continuamos a usar correntes em nossos
pés. Claro que isso é reflexo de outra área social mas não vem ao caso neste
momento.
Junto com o ingrediente da falta de educação, tem-se um outro muio grande:
falta de competitividade. Ao contrário do mundo "fechado", o mundo aberto
não precisou concorrer com ninguém. Isso resultou que fazemos ótimos
sóftwares mas voltados a quem sabe usar e não a quem não sabe (o usuário
final). Diante disso, treinamentos e documentação de alta qualidade foi
deixada de lado pois "todos" sabiam ler um how-to com 120 comandos para a
compilação do kernel, por exemplo.
Diversas teorias muito bem embasadas contam que os seres vivos se adaptam
aos meios. Plantas se tornam aquáticas por necessidade, animais mudam sua
dieta por falta de alimento, seres humanos aprendem novos idiomas por
estarem em outros países. A teoria é bonita e pode ser aplicada aqui, mas
existe um problema. Leva-se anos, décadas para que um determinado ser vivo
se adapte ao meio (quando se adapta) e, infelizmente, não temos estas
décadas dentro de nossa sociedade.
Usuários "windows" estão acostumados a não pensar? Não é verdade. Eles estão
acostumados com as facilidades, mesmo que maquiadas e efêmeras, de um
sistema operacional homonêgeo e que integra dezenas de coisas dentro dele
acessados por leves toques. Além disso, aplicativos criados para esta
plataforma tendem a seguir os mesmos conceitos e também os níveis de
facilidade (reforço, maquiados) do sistema operacional.
No tocante ao conteúdo de documentação, quando falamos na plataforma
Windows, eles simplesmente dão uma surra de tacape no mundo livre. Por quê?
Pelo simples fato que a competição do outro lado ser acirrada e assim,
aquele que consegue abocanhar determinada fatia do mercado o faz
principalmente porque seu suporte e documentação auxilia realmente para que
o usuário aprenda sem ter muita necessidade de "convocar" a empresa
fornecedora ou ainda a recorrer ao vizinho ou ao sobrinho.
Vou lhe citar um exemplo simples disso: gosto de música em um nível mais
alto que a maioria das pessoas. Trabalhei em emissora de rádio como técnico
de gravação e em casas noturnas da região de Campinas/SP por longos cinco
anos. Todos aqueles aparelhos cheio de botões existentes eu os conheço de
trás para frente (incluindo ai os DSP's Alesis ou Yamaha). Aproximadamente
em 97 descobri um aplicativo chamado SoundForge que, até hoje em minha
humilde opinião, é um dos melhores editores de áudio já lançados. Lindo,
maravilhoso, cheio de efeitos e outras coisas. E ele tinha uma vantagem:
mesmo sendo aterrorizantemente complexo, contava com uns tutoriais
multimídia que qualquer ser unicelular seria capaz de usá-lo (prova viva sou
eu).
Quando de minha "migração" para Linux, conheci o Audacity. Um aplicativo
similar no conceito e funcionalidades mas anos-luz de distância no quesito
documentação. Resultado? Até hoje procuro efeitos simplórios dentro dele e
não os acho, mesmo sabendo que existem.
Agora, a pergunta de um milhão: Sou eu um vagabudo que quero tudo a mão? Não
mesmo, longe disso. Eu fuço e muito. Apelo, peço ajuda, converso. Mas não
encontro; simplesmente não encontro o que me satisfaça. Eu sou exigente?
Também. Mas a patota do Audacity é da turma do "quem vai usar é nerd". Aí
meu caro, eu não sou nerd, sou um apreciador de música e um cara que adora
brincar com pistas de áudio. Será mesmo que preciso ser nerd para usar um
aplicativo destes?
Outro deles eu mesmo forneci há alguns dias aqui na lista (a questão da
conversão de formato de vídeo). Um dos colegas me deu uma linha de comando
do fffmpeg que funcionou redondo mas... e se eu não sei abrir um console? E
se eu quero mudar as propriedades?
Vivo isso dentro da comunidade Mambo brasileira donde sou mantenedor.
Enquanto o software não foi totalmente passado para português, seus
downloads não chegavam a 100 por semana. A versão em PT-BR está com duas
semanas no ar com quase 1500 downloads! Da mesma forma, fiz um teste no
tocante a documentação. Criei um wiki onde toda a documentação está sendo
colocada à disposição. Entretanto, percebi que pouco era usada,
principalmente aquela que era somente texto. Criei alguns tutoriais com
imagens (screenshots) dos procedimentos e percebi que aumentou em muito o
uso, mas com um detalhe: o tempo de acesso à documentação não era o
esperado.
Isso resultou na seguinte conclusão: o usuário não lê; ele vê a
documentação, ou seja, segue os passos mediante as telas apresentadas. Esta
conclusão é fácil de ser tirada mediante ao tempo de visitação em uma página
e uma leitura nela. Se o tempo é menor, está sendo usada desta forma.
Para corroborar minha tese, criei com uma ferramenta da Adobe um tutorial
multimídia para a execução de um determinado procedimento. Espanto! A página
contou com mais de 600% de acessos e recebi 10x mais e-mails de
agradecimento sobre o "filminho".
Com isso, o que concluí (e também para concluir minha linha de pensamento):
pecamos na hora de documentar. Escrevemos "wikipédias" de textos e não
colocamos uma mísera figura. Fazemos milhares de how-tos cujo o público alvo
são nossos pares e não aqueles que não sabem. Com isso, perdemos força pois
quem fica não é aquele que sabe um pouco mais, mas sim aquele que tem mais
"saco" para ler.
(Quantos aqui tiveram saco para ler este e-mail?)
Pense à respeito
Abraços
Paulino
--
Paulino Michelazzo
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